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ter, 24 de Novembro

quarta-feira, 19 de abril de 2017

O MANEL MENTIROSO

Conto de Cabo Verde



Numa aldeia, vivia um homem muito mentiroso e, por isso, as pessoas da aldeia chamavam-lhe Manel Mentiroso. Tudo o que ele dizia era mentira e ganhava dinheiro, dizendo mentiras e fazendo apostas.

- Mulher; vou viajar pelo mundo, dizendo mentiras e fazendo apostas.

Todo o dinheiro que ganhar, envio para casa. Levo comigo a vaca. Mulher; dá-me a tua bênção.

- Amén.

Manel pôs o chapéu, pegou na vaca e partiu a correr mundo. Por todos os sítios por onde passava, fazia apostas, ganhava e enviava o dinheiro para casa. Até que chegou a uma aldeia onde vivia um rapaz chamado Joaquinha. O Joaquinha era aquele tipo de rapaz a quem os pais nunca precisavam de dizer:

- Joaquinha, vai estudar!

- Joaquinha, já fizeste os deveres?

O Joaquinha sabia sempre quando era altura de começar a estudar e largar a brincadeira.

- Vou-me embora – assim dizia o Joaquinha.

- Logo agora que o jogo estava na melhor parte!

Os amigos já sabiam que ele era assim e, quando chegava a hora, diziam logo:

- Lá vai o Joaquinha.

O pai do Joaquinha era pescador e a mãe lavadeira na ribeira. Uma manhã, o pai do Joaquinha disse-lhe:

- Joaquinha, a tua mãe está na ribeira a lavar camisas e eu tenho de ir pescar. Tens o almoço na mesa.

Ele foi comer aquilo tudo, mandioca cozida com ovo, cuscuz com mel,etc…Depois, lavou a loiça, arrumou tudo e foi estudar. Quando estava a estudar, bateram à porta. Ele abriu e perguntou quem era. Era o Manel Mentiroso que disse ao que vinha.

- Venho para dizer mentiras e apostar contigo, Se perder, ficas com a vaca, mas se ganhar, levo tudo o que tens dentro de casa.

O Joaquinha achou que aquilo era muito sério e pensou:

- Agora é que vou ver se valeu a pena estudar!

O Manel Mentiroso sentou-se e pediu ao Joaquinha um copo de água fresca. O Joaquinha levou muito tempo a trazer-lhe a água e o Manel Mentiroso perguntou-lhe se ele tinha ido buscar água à ribeira. Joaquinha respondeu que estava à procura de água de anteontem para juntar à água de ontem, para lhe servir a água de hoje.

- Traz qualquer água!

Ele bebeu a água e puxou da caixa do rapé.

- Joaquinha, tu sabias que nasceu uma pessoa com oito braços?

- Eu não digo que não, porque ontem a minha mãe estava a lavar camisas na ribeira e viu uma camisa com oito mangas.

O Manel começou a achar que ia ser mais difícil do que ele pensava.

- Joaquinha, vai buscar brasas para eu acender o cachimbo.

Como Joaquinha nunca mais aparecia, o Manel perguntou-lhe:

- Foste buscar as brasas ao inferno?

- Estou à procura das brasas de anteontem para juntos com as brasas de ontem e para lhe dar as brasas de hoje.

- Traz qualquer brasa.

Ele acendeu o cachimbo, puxou duas ou três fumaças e perguntou ao Joaquinha:

- Joaquinha, tu sabias que o mar pegou fogo?

- Eu não digo que não porque, no outro dia, o meu pai foi pescar e apanhou as sardinhas já assadas.

- Joaquinha, vai-me buscar água fresca, mas traz qualquer água!

Ele bebeu a água e perguntou-lhe:

- Joaquinha, tu sabias que existe uma mangueira tão alta, tão alta, tão alta, tão alta, que se toca tambor de um lado, e não se ouve do outro?

- Eu não digo que não…

- Tu não comeces com o digo que não!

- É que no outro dia passou aqui uma gaivota tão grande, tão grande, que demorou três dias a passar a cabeça, seis dias a passar o corpo e três dias a passar as patas.

Ficamos doze dias às escuras.

- Ó Joaquinha, isso é tudo mentira! Onde é que ia poisar essa gaivota?!

- Ela tinha o ninho na mangueira onde se toca tambor de um lado e não se ouve do outro.

O Manel Mentiroso deu a vaca ao Joaquinha e já se ia embora, quando o Joaquinha lhe disse:

- Corre depressa porque o meu pai deve estar a chegar da pesca. Se te vê, ele mete a estrada no bolso e tu nunca mais encontras o caminho para casa.

Desesperado, Manel Mentiroso desatou a correr a sete pés.

In, PEREIRA-MÜLLER, M. Margarida, “Contos e Lendas da Lusofonia”, Sintra, Colares Editora, 2010

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